domingo, junho 29, 2008

Faz três semanas que esses pêlos crescem na cara. Totalmente impunes. Vão tomando meu rosto e escondendo o menino que ainda insiste em existir.

Aí ele pensa em querer sair para andar de bicicleta, lutar contra nazistas só com o mouse e o teclado, pular onda no mar. Não, menino, não pode. Vai tirar esses pêlos do rosto e saber quanto deu a conta de luz.

Tem e-mails para ler. Tem aqueles planos maravilhosos para colocar em prática. Tem que planejar o futuro. Tem que acreditar. Mesmo se for muito difícil, tem que acreditar.

Hoje eu já tenho litros de antidesengordurante. E uma fé ainda maior em Le Bourget.

sexta-feira, junho 13, 2008



Nós, náufragos

Treze de junho de 1983. Há exatos 25 anos, a humanidade foi além de qualquer limite antes conhecido. Naquele dia, um objeto construído pelo homem cruzava as fronteiras do Sistema de Solar pela primeira vez. Em tempos de Guerra Fria, quando uma hecatombe nuclear poderia acontecer a qualquer momento, foi um dia de esperança. Hoje, com o medo do aquecimento global, há quem ainda espere algum sinal positivo vindo do espaço.

Lançada onze anos antes para investigar o planeta Júpiter, a sonda espacial Pionner 10 começava sua segunda missão: enviar um recado da humanidade para alguma civilização extra-terrestre desconhecida. Mais ou menos como uma garrafa jogada ao mar por um náufrago.

A idéia surgiu quando a NASA percebeu que a nave poderia ir bem além de Plutão e, depois disso, seguir eternamente rumo ao infinito. Foi quando os cientistas Frank Drake, Eric Burgess e Carl Sagan, mais tarde conhecido pelo romance "Contato" e o vídeo "Pálido Ponto Azul", apresentaram a idéia. Uma placa de ouro seria afixada na antena da sonda espacial, protegida da poeira cósmica e da radiação, contendo uma mensagem de "nós estamos aqui".

Mas o que escrever para os extra-terrestres?! E como? Carl foi para casa e pensou que o melhor era fazer isso com sua esposa, Linda. Juntos, eles desenharam o que julgaram ser mais importante: um homem e uma mulher nus, em escala com as dimensões da Pionner; a localização da Terra no sistema solar e do Sol na galáxia; e uma molécula de hidrogênio, o elemento mais abundante no universo. Teoricamente, qualquer civilização inteligente entenderia o recado.

Ao que se sabe, a placa nunca foi encontrada por ninguém. A Pionner 10 manteve contato com a Terra até 23 de janeiro de 2003, quando estava a 12 bilhões de quilômetros de distância e suas baterias finalmente descarregaram. Aparentemente, nada de estranho havia acontecido. No máximo, virou um bom roteiro para filmes e games de ficção científica.

Mas a NASA também gostou da idéia. Em 1973, a Pionner 11 levou uma placa semelhante para outra missão fora do Sistema Solar. Cinco anos depois, as sondas Voyager 1 e Voyager 2 rumaram para as galáxias vizinhas com novas mensagens eventuais extra-terrestres.

Dessa vez, um disco fonográfico de cobre e ouro levava vários sons da terra. Em 90 minutos de gravação, mais tarde lançados aqui mesmo, em CD, foi feita uma seleção completa de sons como o canto dos pássaros, trovões, chuva, onda, vento, canto de baleias, músicas de diversas culturas, incluindo "Jonnhy B. Good", de Chuck Barry, e saudações em 55 línguas, entre elas o português.

Cento e quinze imagens também foram analogicamente gravadas nos discos. Mas o ser humano foi incluído só de silhueta. O problema é que, na dúvida sobre nossas mensagens serem ou não achadas por alguma civilização, os protestos na Terra foram grandes. Por conta do desenho do homem e da mulher nús, grupos conservadores acusaram os cientistas de mandarem "obscenidades" para o espaço.

O disco também ficou sem a música "Here Comes The Sun". Os Beatles gostaram da idéia. Já a gravadora EMI não gostou nem um pouco. Eles não queriam permitir que uma música fosse tocada sem que fossem pagos os direitos autorais. Nem mesmo a bilhões de quilômetros da rádio mais próxima...

quarta-feira, junho 04, 2008

Imagino quantos viram aqueles prédios, como eu vi, mas sem saber direito em qual quarto dormiriam na semana seguinte. Monstros de ferro, concreto e vidro a engolir milhões de vidas com o sonho de asfalto e cifras.

Mesmo que cifras só para o feijão e a vontade de voltar.

Teria eu, também, este sonho de falar como falo e ser acusado de sotaque arrastado?! Tirar uma lasquinha de tanto cinza, enfrentar o frio e perder-se entre o ônibus e o jantar?!

Em um metrô debaixo da terra, em avenidas anônimas, em querer tirar foto onde é só mais uma esquina pra quem passa ao lado. Impressionado com o preço de tudo, com o tanto de revistas na banca, as possibilidades, as possibilidades.

Não há concreto. Não há vidro. Não há asfalto. Não há sequer só aquele cinza sem fim no céu. São Paulo pulsa saudades nos buracos daqueles trilhos escuros, sem sequer sinal de celular.

Algo aconteceu.

Algodão no nariz, medo, lágrimas. Dizem que ele teria saudades, mas que não gostaria de nada. Só uma dor pela dor dela, e um lamento pelo será.

Seis mãos na peça de madeira barata, para virar pó, quem sabe. Palavras pouco importariam. O ouvido não escutava mais. A boca não falaria mais. O nariz, só um enfeite de face fria e fechada.

Lembranças, lembranças e uma ironia. Como poderia ser, logo assim?! Nome entre uma lista onde tanto sonhou estar, mas que tivesse início e fim. E o presente para eles mesmos, ainda tão novo, uma boa dica de que pedaço era aquele.

Nada aconteceu.

E, só depois do pouso, descobri que tive medo de avião. E não foi por mim.